Pesquisadora mineira, trans e autista desenvolveu tese falando sobre o assunto
Dois diagnósticos, autismo e transsexualidade, trouxeram para a vida de Sophia Mendonça desafios que, somente com muita coragem e apoio, foram superados.
Hoje, aos 25 anos esta mineira é Mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), palestrante, pesquisadora e escritora, mas o caminho para chegar até aqui não foi fácil.
Quem vê Sophia conversando sobre autismo em seu canal Mundo Autista, no Youtube, criado em 2015, percebe a naturalidade com que a jovem fala sobre diferentes assuntos dentro do universo do TEA (Transtorno do Espectro Autista) e aborda outras particularidades que podem estar relacionadas ao transtorno. O canal é uma parceria entre Sophia, que foi diagnosticada com autismo aos 11 anos e sua mãe, diagnosticada tardiamente, aos 53 anos de idade.
Mãe e filha portadoras do TEA usam o canal para falar sobre vários assuntos, dentre eles também, a transsexualidade. Sophia conta que sempre se percebeu uma menina num corpo de menino, embora na infância e adolescência isso soasse para as demais pessoas como homossexualidade. Sua transição começou aos 23 anos, em 2020.
Entre o início do tratamento e a cirurgia de redesignação sexual foram apenas dois anos. O procedimento final, que a deixou com um corpo feminino foi realizado na Transgender Center Brazil, em Blumenau, neste ano, sob cuidados do médico Dr. José Carlos Martins, referência no assunto.
Autora de dez livros, com obras de diferentes estilos, de poesia a fantasia e negócios a crônicas, tornou-se referência para milhares de mães, pais e autistas, que buscam através dos seus canais, mais informações sobre o tema.
Entre os assuntos abordados se discute uma maior incidência da transsexualidade em portadores do TEA. O tema, que serviu até para sua tese de mestrado na UFMG, discorre sobre pesquisas que apontaram ser de 7,59 vezes maior a possibilidade de uma pessoa autista também ser transexual.
Foi pesquisando sobre o assunto que ela descobriu que, já na década de 1990, à medida que um número crescente de crianças buscava atendimento relacionado à sua identidade de gênero, médicos e pesquisadores começaram a notar uma tendência maior de que estas crianças tinham traços de autismo.
Desde então, através dos avanços nos estudos genéticos e de comportamento, pesquisas científicas têm constatado a transgeneridade, assim como as orientações afetivas e sexuais dissidentes, são mais comuns na população autista do que entre os neurotípicos, como são chamadas as pessoas não neurodivergentes.
O termo foi criado em 1998, quando a socióloga e ativista Judy Singer criou o termo neurodiversidade como sinônimo de biodiversidade neurológica, pontuando que somos todos neurodiversos, precisamente porque, embora pertençamos à mesma espécie, não existem dois cérebros iguais.
Dentro da neurodiversidade humana, entretanto, algumas pessoas compartilham uma série de características em comparação com outras. Na verdade, a maioria dos indivíduos segue um desenvolvimento neurológico que, sem considerar as diferenças individuais, pode ser considerado típico. Essas pessoas são chamadas de neurotípicas.
Uma parte menor da população (que está entre 15 e 20%) compartilha um desenvolvimento neurológico em alguns aspectos diferente da maioria, descrito do ponto de vista estatístico como atípico. Essas pessoas são definidas como neurodivergentes ou neuro
Para John Strang, o neurologista pediatra que coordenou o estudo onde se observou uma incidência sete vezes maior de trans em autistas, crianças e adolescentes com o transtorno podem ser menos influenciadas pelas normas sociais (neurotípicas) e, portanto, podem apresentar seu eu interior de forma mais autêntica.
“Sempre fui comunicativa, um lado menos desenvolvido em autistas. Gosto de ajudar as pessoas e uso minha história pra isso, seja como portadora de TEA ou como mulher trans. Observar e entender que uma proporção maior de autistas pode ser trans, ou outra orientação afetiva dissidente, pode ajudar outras famílias a perceberem cedo o tipo de ajuda e apoio que seus filhos precisam”, explica Sophia.
Além do site e do canal do YouTube, mãe e filha possuem páginas em redes sociais onde dividem informações sobre os temas e abrem espaço para outras pessoas compartilharem experiências similares.
Fotos: Arquivo pessoal
Autor(a): Alex Ferrer
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